Raquel Faria: “Históricos são os erros da nossa urbanização e não as chuvas”

30/01/2020 | Nossas cidades

“Chuva em Minas expõe a anestesia geral”

 

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Foto: Agência Minas

 

É preciso considerar a hipótese de Minas Gerais ficar em outro país, um que não esteja presidido por Jair Bolsonaro, comenta o jornalista Roberto Dias em artigo publicado nesta quinta-feira (30) na Folha de S. Paulo. Para ele, “a anêmica reação de Brasília à tragédia mineira choca tanto quanto as imagens: enquanto os belo-horizontinos buscavam corpos na lama, o presidente declamava paixão pela música sertaneja”.

Somente nesta quinta Bolsonaro deve realizar um sobrevoo nas áreas afetadas pelas chuvas em Minas, junto com o ministro da Defesa, o general Fernando Azevedo, e possivelmente o governador mineiro. A visita presidencial foi confirmada nesta manhã pelo Palácio do Planalto.
Eis o restante do artigo na íntegra:

“Também não se pode descartar a tese de que o melhor mesmo é os políticos não falarem nada. Porque podem incorrer na declaração do governador mineiro, Romeu Zema, para quem estava “tudo sob controle”.

Também nesse caso, o que se ouvia não guardava relação com o que se via. Tinha hospital alagado. Entregador de comida no alagamento. Restaurante que parecia ter se transformado em um estabelecimento à beira do rio. Barranco caído. Asfalto que desmoronou e engoliu veículos. Mais realista do que Zema, uma moradora desenhou: “Os carros passavam como se fossem de brinquedo”.

O prefeito não parecia se ver tão no controle quanto o governador. Alexandre Kalil definiu o desastre como o maior da história local.
Primeira cidade moderna planejada do Brasil, construída no fim do século 19 para ser a capital mineira, Belo Horizonte agigantou-se para virar o coração da terceira maior região metropolitana do país, com 6 milhões de habitantes. Como sói ocorrer, o planejamento desandou.

Não chega a ser difícil prever que vai dar problema. O último decênio é prova de que as tempestades do verão são mortais —de modo que dizer que caiu muita água é chover no molhado para se esquivar.

A despeito dessa obviedade, o governo federal cortou a verba para prevenção de desastres ao menor patamar em 11 anos. Foram R$ 99 milhões no ano passado. Tragédia posta, apareceu dinheiro; só em Minas, R$ 200 milhões, o dobro do desembolsado em todo o país.

Zema falou em décadas para resolver o problema. Nesse caso, a frase não chocou, talvez porque a anestesia geral com a tragédia mineira não esteja restrita aos políticos.

 

Raquel Faria é jornalista e criadora do site de notícias "Os Novos Inconfidentes".