
Se a oposição divulgar o seu programa de governo, ela não terá apoio popular para o impeachment
A campanha do impeachment se transformou numa disputa política cega do ponto de vista programático. A oposição quer afastar Dilma, mas o que defende nos planos democrático, econômico e social para o Brasil? A oposição se opõe, mas nada propõe. A oposição denuncia, mas nada anuncia publicamente para governar o Brasil. A oposição tem sim propostas para gerir o Brasil, mas as esconde porque sabe que as mudanças propostas serão repudiadas pela população. A oposição mantém um debate programático restrito a um pequeno círculo, formado por empresários, caciques de partidos, mídia e economistas.
Economistas liberais dizem que a oposição está mentindo
Dois economistas liberais – Samuel Pessoa e Marcos Lisboa – que ilustram o post, afirmam que a oposição está mentindo para o povo brasileiro sobre a crise econômica. Samuel Pessoa vai direto ao ponto sobre as manifestações da oposição: “As ruas pensam que nossos problemas estruturais se resumem à corrupção, que teria atingido valores extraordinários com o petismo. A troca no Planalto faria aparecer recursos vultosos no caixa do Tesouro, tornando possível uma solução para nossa crise fiscal. Os fatos vindos a público pela Operação Lava Jato somente reforçam esse diagnóstico. As ruas estão erradas”. (Ceticismo sobre o governo Temer, Folha de S.Paulo, 20/03/2016 ).
Marcos Lisboa é outro economista liberal que denuncia a incoerência de parte do empresariado que apoiou muitas das decisões econômicas de Dilma: “Claro que o governo liderou o processo, mas não foi sozinho. Esse reconhecimento do fracasso e da corresponsabilidade é fundamental. Lideranças empresariais apoiaram as desonerações, a intervenção no setor elétrico, no preço dos combustíveis, a explosão do crédito subsidiado, as proteções setoriais. Atribuir unicamente ao governo que está lá a culpa e achar que trocar governo resolve, não resolve”.
O programa de governo de Michel Temer e do PSDB
Samuel Pessoa e Marcos Lisboa participaram da elaboração de inúmeros roteiros programáticos da oposição no último período. Suas elaborações inspiraram o documento “Uma ponte para o futuro”, da Fundação Ulysses Guimarães do PMDB, uma espécie de programa de governo do vice-presidente Michel Temer. Uma outra contribuição relevante foi do economista Armínio Fraga, coordenador de campanha do tucano Aécio Neves, denominada “Respostas à altura da crise”, publicado na mídia do Rio e de São Paulo.
Os principais pontos programáticos de Michel Temer e do PSDB são os seguintes: a) fim da CLT, com o “negociado” se sobrepondo ao “legislado”; b) fim da estabilidade no emprego dos servidores públicos; c) aposentadoria aos 65 anos para homens e mulheres, professores e demais trabalhadores; d) fim do salário mínimo como piso dos benefícios previdenciários e outros benefícios sociais; e) fim dos reajustes anuais dos benefícios previdenciários e demais benefícios sociais; f) fim das vinculações de recursos para saúde e educação e adoção do orçamento base zero, ou seja, sem quaisquer vinculações constitucionais; g) privatização de todas as empresas estatais, com revisão do capítulo da ordem econômica da Constituição Federal; h) arrocho dos gastos públicos por tempo indeterminado, com superávit primário de até 3% do PIB, estabelecimento de um teto para a dívida bruta federal; e manutenção dos juros em taxas elevadas. Em todos os textos não existe nenhuma proposta que implique algum sacrifício para os ricos.
Programa ultraliberal é incompatível com a democracia
Samuel Pessoa conclui o seu artigo: “Sou cético quanto à capacidade de um governo Temer, mesmo com o apoio de sólida base parlamentar, de redesenhar nosso Estado sem que esse tema seja tratado de forma explícita em um processo eleitoral”.(...) “O problema somos todos nós. As ruas não estão preparadas para essa mensagem. Preferem a ilusão de que o fim do PT no governo nos redimirá e resolverá nosso conflito distributivo ao eliminar a corrupção. Não é o caso”.
Como se vê, Samuel Pessoa é favorável a uma nova eleição presidencial. E quer que o programa liberal “seja tratado de forma explícita em um processo eleitoral”. Evidentemente, que qualquer candidato que defenda um programa ultraliberal não terá chance alguma de se sair vitorioso do processo eleitoral. Como disse José Luiz Fiori, o ultraliberalismo é impossível em regimes democráticos, por isso mesmo ele só triunfou em países que adotaram ditaduras como no Chile, uma espécie de “fascismo de mercado”.
Para a oposição impeachment é um meio; o fim é um programa liberal de cortes radicais nos direitos do povo. O impeachment é, portanto, uma tentativa de impor um enorme “estelionato político” ao povo brasileiro, com a consolidação de uma “democracia relativa”. Não terão que se submeter às urnas, como propõe Samuel Pessoa, para aprovar o corte nos direitos do povo; o presidente que irá implementá-lo será alçado através de um golpe branco. Depois de empossado, as estratégias serão: a adoção de uma agenda positiva para as forças emergentes do golpe; um combate severo ao legado dos governos do PT e de seus aliados; a constituição de uma base sólida no Parlamento, na mídia e no aparelho de estado; e o encurralamento das forças de esquerda que tentarem estabelecer uma resistência ao desmonte de nossas conquistas.
O cientista político José Luís Fiori afirma que a tentativa de adoção do ultraliberalismo no Brasil vai levar a conflitos de grandes proporções: “No Brasil não faltam – neste momento – os candidatos com as mesmas características e os economistas sempre rápidos em propor e dispostos a levar até as últimas consequências o seu projeto de ‘redução radical do Estado”, e se for possível, de toda atividade política capaz de perturbar a tranquilidade de sua “aritmética econômica”. (...) “Neste sentido, não está errado dizer que os dois lados deste mesmo projeto são cúmplices e compartem a mesma e gigantesca insensatez, ao supor qu e seu projeto golpista e ultraliberal não encontrará resistência, e no limite, não provocará uma rebelião ou enfrentamento civil, de grandes proporções, como nunca houve antes no Brasil”.